30 de jun. de 2008

Pirataria x novas formas de direito autoral

Já discutimos aqui no Caroço sobre a pirataria de CDs e DVDs. Como disse na ocasião, acho que as empresas de produção e distribuição de audio e video deveriam começar a pensar em novas formas de comercialização (como já fazem algumas gravadoras e como fazem artistas independentes) ao invés de continuar a fazer, contra a pirataria, campanhas terríveis (cada vez mais terríveis, diga-se de passagem. No caso dos DVDs, da questão ética do pai que pode, com a compra de materiais piratas, incentivar o filho a colar na prova, agora assistimos, antes dos longas-metragens, à relação da compra dos materiais pirateados com o tráfico de drogas, seqüestros e assaltos).

Alguns países já começaram a pensar na questão, e mesmo a implementar novas regulamentações para o setor, como mostra matéria feita pelo Globo on line e reproduzida por Simone Pereira de Sá no blog Labcult, para o qual contribuo menos do que deveria.


Vou colar a íntegra da matéria aqui e, "pirateando" o post da Simone, incentivar a discussão sobre a lei espanhola e sobre o tipo de lei que poderia ser implementada no Brasil.



Lei de direito autoral na Espanha abre espaço para 'salvar' ganhos de artistas na era digital

Publicada em 23/06/2008 às 08h49m Rodrigo Pinto - O Globo Online

RIO - A entrada em vigor na Espanha, na semana passada - após caloroso debate de 15 meses no parlamento - do chamado canon digital, pode iluminar o pobre debate em torno dos downloads e cópias ilegais no Brasil. Na prática, o governo espanhol determinou a taxação na compra de aparelhos tocadores de MP3 e MP4, celulares, pen drives e discos rígidos externos. O imposto recolhido será usado para pagar direitos autorais, cujo volume vem se reduzindo em todo mundo em função do abandono de mídias físicas - como o CD - como suporte para músicas, filmes e outros bens culturais.
Ao invés de coibir a chamada cópia privada como forma de garantir que consumidores continuem pagando direitos autorais na compra de CDs, por exemplo, o governo espanhol ampliou o recolhimento sobre itens de armazenamento e reprodução de arquivos digitais. O país europeu, assim, se colocou no córner oposto ao dos Estados Unidos, que defendem - e praticam - ações policiais e prisão de internautas que baixem arquivos sem pagar.
- Na Espanha, o imposto foi adotado para que se permita a cópia privada. Esse é um dos modelos que o debate brasileiro tem ignorado - sublinha Ronaldo Lemos, diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas, onde coordena a área de propriedade intelectual, e também diretor do projeto Creative Commons no Brasil.
Ronaldo lembra que, desde 1998, quando foi aprovada a nova lei de diretos autorais no Brasil, está proibida a cópia privada.
- Inclusive para fins educacionais e científicos. Este debate traria de volta a possibilidade da cópia privada e para estes fins, o que era permitido na lei anterior, de 73. Não podemos continuar só na base do pode, não pode - critica.
No recente - e vertiginoso - processo de migração dos consumidores para a internet, os autores são a ponta mais frágil. Houve, nos últimos anos, quem imaginasse que, diante da enxurrada de downloads ilegais e CDs piratas, seria difícil remunerá-los. Mas o canon digital espanhol traz novas possibilidades, inclusive a de provedores de acesso serem incluídos no rateio dos recursos que pagarão autores em tempos de arquivos digitais trocados em alta velocidade e de forma incontrolável.
- Tem gente que ganha muito dinheiro na internet e acaba se privilegiando da reprodução e dos downloads de conteúdo que outra pessoa criou. Nesse sentido, parece-me sensato que sites, provedores, patrocinadores, enfim, paguem direitos autorais - defende o compositor Roberto Frejat, parceiro de Cazuza, líder do Barão Vermelho (em recesso) e atualmente dedicado a seu trabalho individual.
Atualmente, já há tecnologia para rastreamento de downloads de arquivos digitais que permitiria a contabilização e o rateio - tal como é feito na execução em rádio - e a repartição por amostragem. Se, no dial, quem toca mais ganha mais, na troca de arquivo digital, que for mais baixado ou executado (no YouTube ou no MySpace, por exemplo) teria uma porção maior no rateio.
- Isso é uso inteligente da tecnologia, que poderia ser aplicada no lugar da ação policialesca - acrescenta Frejat.
O assunto é polêmico e requer, de fato, mais e mais debate. Na Espanha, durante os 15 meses de dicussão, associações de internautas e produtores de eletrodomésticos criticaram duramente o imposto - antes restrito a CDs, DVDs, impressoras e gravadoras de CD/DVD.
"É um imposto injusto, porque incide com o mesmo valor sobre o celular que custa 50 euros e o que custa 500 euros", criticou, em depoimento ao site do jornal "El País", Víctor Domingo, presidente da Associação de Internautas da Espanha. No entanto, associações de autores, de editores de livros e de produtores cinematográficos comemoraram a mudança na lei.

Mais sobre adaptação cinematográfica de romances

Para dar um pouco de continuidade ao post anterior: mês passado foi divulgada a data de estréia do filme Ensaio sobre a cegueira, adaptação do romance do português José Saramago pelo brasileiro Fernando Meirelles, 12 de setembro.

Estou fazendo um pouco do dever de casa jornalístico. Li o livro - que estava há um bom tempo na estante, esperando sua vez - e voltei a acessar o blog do diretor. É um blog muito instigante, embora a última atualização tenha sido em março. Lá estão uma série de questões que certamente passam pela cabeça de todo artista. Meirelles conta que já fez dez montagens do filme. Toda obra é feita de sucessivas escolhas, e muitas vezes o artista "dá à luz" um filme, um livro, etc. sem ter certeza de que optou pelas melhores opções.

Meirelles conta sem nenhuma falsa inocência que opiniões diversas interferem na montagem, desde opiniões de amigos até - ou principalmente - dos produtores da Miramax. As divergências sobre as cenas de violência sexual - que, no livro, são certamente as mais impactantes - já me fazem pensar antecipadamente se o filme não ficaria melhor com a violência mais explícita. No livro, são muito explícitas. E por isso são fortes. São cenas mais narrativas do que as outras, que são pontuadas da ironia ensaística do autor. E também alguns filmes maravilhosos têm cenas de sexo explícito, como O império dos sentidos. Mas esperemos o filme...

Uma última degustação: a reação de José Saramago à exibição do filme.

Onde andará Dulce Veiga? - o filme


Estava aguardando com bastante curiosidade a estréia de Onde andará Dulce Veiga?, filme de Guilherme de Almeira Prado baseado no romance homônimo de Caio Fernando Abreu. Primeiramente, algumas das razões para o interesse em uma adaptação desse livro para as telonas. O livro - um romance B, segundo Caio - é uma mistura de sofisticação literária e referências kitschs e cinematográficas. Além disso, ele faz parte daqueles livros do autor que se tornaram símbolos dos anos 80 (como "Morangos mofados"). E, também, Guilherme de Almeida Prado participou muito de perto do processo de criação, o que o gabaritava para a tarefa. (A interessante história desse processo criativo pode ser lida nesta matéria de Luiz Zanin Oricchio, do Estado de S. Paulo.)

O filme, no entanto, cai em muitos erros comuns ao cinema brasileiro e às adaptações de romances. Primeiramente, o roteiro padece de "literatice": muitas vezes, o texto foi passado diretamente para a fala dos personagens, deixando de lado o fato de que o diálogo deve ter características muito diferentes em literatura e em cinema. Além disso, muito da tensão (de certa forma, histórica) que Caio conseguiu produzir foi eliminada - ou simplificada. (Aqui, uma análise da revista Moviola sobre isso.) Do ponto de vista técnico, além da irregularidade dos atores, incomoda a edição de som, mesmo para um "filme B" - ou um filme que dialoga com os filmes B. A dublagem dos momentos em que Dulce Veiga (Maitê Proença) canta incomoda, quase tanto quando a inexpressividade dos momentos musicais de Márcia F. (Carolina Dieckmann) e do protagonista (Eriberto Leão).

E tem o final... Mesmo nesse ambiente incerto de sonho que o filme captou bem do livro, a cena final me parece uma redenção não merecida por uma história tão dúbia. Parece que aquela atmosfera ao mesmo tempo "kitsch" e "dark" da história de repente é transplantada para o capítulo final de uma telenovela.

Enfim, embora tenha momentos ótimos, principalmente aqueles em que consegue ser fiel aos temas caros a Caio Fernando Abreu (como o erotismo), o filme não consegue cumprir a tarefa às vezes hercúlea de adaptar um romance, mesmo que seja um "romance cinematográfico".

28 de jun. de 2008

Manipulação da informação, nem sempre bem feita

A gente não cansa de comentar como a chamada grande mídia manipula informações, esconde dados e fatos, privilegia abordagens de acordo com seus interesses econômicos e políticos. Para que isso tenha eficácia e os leitores continuem a confiar no veículo, essas estratégias têm de ser bem feitas. A escolha de abordagem, a ênfase maior ou menor em certos assuntos, a "opção" por "não mostar" certos índices podem até aparecer. O leitor vai entender que faz parte da linha editorial do jornal e filtrar a informação. Mas deixar transparecer a manipulação de dados pega mal, né?

Foi o que aconteceu no jornal O Globo de hoje. Na sua matéria pincipal.

Título: "Geladeira nova, nem sempre cheia"

Subtítulo: "Pesquisa do Ibase mostra que 54,8% dos que têm Bolsa Família enfrentam restrição de comida"

Lide: "Mais da metade das famílias beneficiadas pelo programa Bolsa Família, do governo federal, passa fome ou não tem quantidade de alimentos suficiente em casa. Pesquisa divulgada hoje pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) traça um perfil dos inscritos e mostra que o padrão de consumo das famílias, por mais que enfrentem problemas para comprar comida, mudou. A transferência de renda serve, muitas vezes, como cartão de crédito para comprar eletrodomésticos, dada a regularidade dos depósitos."

Persongem (único) que ilustra a matéria: A dona de casa Clotilde Alves do Nascimento, de quem se diz: "Beneficiada no Piauí usa dinheiro para comprar geladeira, fogão e roupas".

Resumindo, o dinheiro do programa Bolsa Família, ao invés de ser gasto com alimentos, está sendo gasto com outros materias de consumo, com ênfase nos eletrodoméstico. Certo?

Não é isso o que os dados da pesquisa do Ibase dizem. O comportamento do dona Clotilde (e não quero aqui fazer qualquer juízo de valor, acho mesmo que dona Clotilde tem suas razões e seu direito de comprar geladeira, fogão e roupas) não é nem 1% do comportamento dos beneficiários do programa. Aliás, parece ser um comportamento tão raro que o índice não pode ser precisado. Os números da pesquisa estão estampados em gráficos no próprio jornal:

"De acordo com os titulares, o dinheiro do programa Bolsa Família é gasto principalmente com":

alimentação - 87%
material escolar - 46%
vestuário - 37%
remédios - 22%
gás - 10%
luz - 6%
tratamento médico - 2%
água - 1%
outras opções - menos de 1%

Diante desses índices, por que a ênfase na geladeira? Pegou mal - pro jornal. Pro leitor, matérias como essa tem uma função muito importante. Mostrar que a manipulação existe. Ou que o jornal pensa que seu público é burro.

27 de jun. de 2008

Com todo gás


Não é de hoje que venho tentando eliminar os refrigerantes da minha vida. É muita cafeína, acidulante, corante, estabilizante, antioxidante e edulcorante (adoçante) para uma pessoa só. Além de gastrite e aumento do colesterol, a prática pode me levar a desenvolver um câncer no esôfago, e eu não estou a fim de morrer desse jeito. Não mesmo.

Fico imaginando a dificuldade dos pais em educar seus filhos a ingerirem líquidos mais saudáveis. Os refrigerantes estão por todos os lados, nas ruas, nos bares, nas cantinas escolares, nos hospitais, nas bancas de jornais e nas prateleiras dos supermercados, obviamente. Embalagens coloridas e cintilantes. Quase lúdicas.

Dados da Abir (Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas Não-Alcoólicas) revelam que os brasileiros consomem, anualmente, 66 litros de bebidas não-alcoólicas. Nesse rol estão, além de refrigerantes, os chás, sucos, energéticos, isotônicos e águas minerais.

O consumo médio diário de refri, no Brasil, é de 165 ml. A campeã disparada, segundo a AC Nielsen, é a Coca-Cola comum, com 37,3% do mercado. Depois vêm a Fanta Laranja, com 6,4%, Guaraná Antarctica (5,7%), Pepsi (4,1%) e Coca Zero (4%). Donde se conclui que, até nesse setor, somos engolidos pelas multinacionais. A Coca detém, absoluta, espantosos 50% do mercado nacional.

Um mercado disputado, que gera grandes lucros. Mas como ficam as empresas brazucas? Informações da Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil (Afrebas) dão conta de que, nos últimos cinco anos, cerca de 66% dos produtores de refrigerantes brasileiros deixaram de produzir, provocando a demissão de mais de 50 mil trabalhadores.

A explicação é que as multis ganham isenções fiscais, o que prejudica os nossos fabricantes. Nesse cenário, as marcas brasileiras perdem forças e se restringem aos mercados locais. É o caso de Xereta, Maracanã, Frutty, Fanny, Simba, Kareta, etc. Com mais expressão, marcas como Dolly e Schin ainda conseguem ir mas longe.

A força do Jesus

De cor rosa é sabor adocicado, o Guaraná Jesus, popular em São Luís do Maranhão, foi criado pelo farmacêutico Jesus Norberto Gomes, em 1920, época em que sequer havia refrigerante no País. Reza a lenda que a bebida surgiu acidentalmente, quando Gomes tentou sintetizar um remédio famoso na época utilizando uma máquina de gaseificação importada. Não se sabe ao certo a composição, mas dizem que há no refrigerante 17 ingredientes, entre eles ervas e produtos que o farmacêutico descobria em suas viagens pela Amazônia.

A família de Jesus manteve fábrica própria até o início de 1960. Os filhos que comandavam o negócio do pai farmacêutico partiram para São Paulo e a família decidiu vender a fábrica - mas não a marca - para a Antarctica. Naquela ocasião, os Gomes acusaram a empresa de adulterar e boicotar o produto, iniciando então uma briga judicial. O contrato foi rompido, mas a família ficou sem fábrica para produzir a bebida.

Por isso, o Jesus ficou sete anos fora do mercado até ser vendido, em 1980, para a Companhia Maranhense de Refrigerantes, que já tinha licença para fabricar e distribuir a Coca-Cola no Estado. Embora seja distribuído apenas no Maranhão, o produto pode ser encontrado na Feira de São Cristóvão, no Rio de Janeiro, e em outros pontos específicos escondidinhos pelo Brasil.

26 de jun. de 2008

Muito mais que um sonho


Parecia um sonho. Mas felizmente foi real. Um governo genuinamente socialista encheu de esperança um país e a América do Sul. À frente, coincidentemente mais um médico. Um líder que desejava um governo voltado para a educação, um país independente do capital estrangeiro exacerbado, uma "via chilena para o socialismo". O sonho se tornou mais real quando ele nacionalizou as minas de cobre, que eram brinquedinho de multinacionais, e os bancos. E o incrível: dividia os lucros com os funcionários.
Em sua breve passagem, mais realidades: a inflação caiu, o poder aquisitivo aumentou, a economia também. Tudo em um âmbito democrático e limpo. Foi demais para o império do norte. Na seqüência de horror, corrupção, roubalheira, imundice e assassinatos que varriam o continente, o sonho real se tornou pesadelo. A onda paranóica para servir a interesses do outro hemisfério se fez presente com bombas e homicídios dele, de 7 mil conterrâneos, de um país, de um continente.
Hoje, Allende faria aniversário. A lembrança desta data e deste homem em jornais e sites, porém, comprova que, sem dúvida, não foi um sonho. Foi real. E pode ser real novamente. E está sendo real por aí. Basta não deixar o pesadelo que vem lá de cima fazer crer que tudo não passa de sonho.

Equipe da UFRJ sobe no pódio mais uma vez na Holanda



Brasileiros já ocupam a quarta posição geral da Frisian Solar Callenge

No fim desta quarta-feira, a equipe do Pólo Náutico da UFRJ, que participa da Frisian Solar Challenge, na Holanda, subiu no pódio mais uma vez. O piloto Rafael Coelho fez os 32km do percurso Stavoren - Bolsward em 3 horas e 20 minutos, chegando em terceiro lugar, repetindo o desempenho do dia anterior e garantindo o quarto lugar geral da competição que envolve outras 48 equipes, todas européias.

A Frisian Solar Challenge é um rali de barcos solares, projetados e construídos pelos próprios participantes, e caracteriza-se como uma forma de divulgar e popularizar fontes alternativas de energia para embarcações, que costumam utilizar motores de combustão.

No site oficial da Frisian Solar Challenge, o time carioca chegou a ser definido como o exótico do samba brasileiro. Em matéria do dia 11 de junho, a Agência de Notícias Holandesa (Dutch National Press Agency), com um certo tom de desdém, disse que a equipe da UFRJ não era de encher os olhos no quesito tecnologia, mas certamente chamava a atenção por ser a única não européia da competição.

Nos três dias que precederam o início oficial da competição, no domingo, dia 22 de junho, os barcos e os pilotos de todas as equipes passaram pela inspeção técnica classificatória da corrida. Foram avaliados os cascos, os circuitos elétricos e os itens de segurança das embarcações. Para os pilotos oficiais e seus suplentes, houve testes de natação e manobra.

No domingo, a equipe saiu em décimo primeiro lugar, posição conquistada depois de duas provas para definir a largada: uma primeira de 10km, a qual deveria ser realizada no tempo limite de uma hora e 15 minutos, que o Copacabana completou em 1h04m, e também um teste de sprint, em um percurso de 70 metros, com velocidade máxima. Algumas equipes voltaram para casa. Após a prova, devido aos fortes ventos, o Copacabana virou e teve que ser resgatado pela equipe de terra. No acidente, o barco perdeu um dos painéis solares, o qual foi reposto pela organização da Frisian.

Na segunda-feira, depois de uma noite de trabalho reparando o sistema eletrônico e instalando o novo painel solar, a equipe Copacabana estava de pé às sete da manhã, pronta para a última fase de inspeção técnica, marcada para as 11h30 da manhã, horário local. Felizmente para a equipe, o tempo não havia melhorado. Devido aos ventos fortes e a chuva em Leewarden, os organizadores decidiram adiar o início das provas para as 15h, dando mais tempo para a equipe brasileira testar melhor o sistema já reparado.

Na perna de segunda-feira, os barcos percorreram o trecho de 25 km entre Leewarden e Sneek. Chegando na cidade destino, um outro desafio: os canais do local são cruzados por muitas pontes baixas que os pilotos dos barcos optavam por evitar ou atravessar, o que exigiu um trabalho de estratégia de navegação e criatividade das equipes de terra. Nesta primeira perna da competição, Leewarden-Sneek, o Copacabana completou em sétimo lugar.

Na terça-feira, na segunda perna da competição, nos 42 km de canais entre Sneek e Stavoren, os brasileiros concluíram em terceiro lugar, atrás apenas do barco polonês de Gdansk e do holandês de Groningen. O Copacabana manteve a velocidade de 10km/h e completou a perna em 4 horas, 17 minutos e 45 segundos. A embarcação se beneficiou de um trecho de sombra do canal, de 20 minutos, que fez cair a velocidade das embarcações. Os motores mais potentes precisam de mais energia e, sem poder captar a energia solar pelos painéis, rapidamente consomem suas baterias extras. O motor do Copacabana, mais econômico, permite um uso de 30 a 40 minutos de bateria mesmo na sombra.

O time subiu pela primeira vez no pódio na terça-feira, no camping de Stavoren, onde foram parabenizados pela organização da competição e pelo prefeito da cidade.

A Frisian Solar Challenge começou no dia 21 de junho e termina no próximo sábado, dia 28.

***

Mais sobre a Frisian no blog da Equipe Copacabana.

Paixão gay

Título de matéria no site G1, editoria São Paulo/Polícia:

"Paixão gay pode ter motivado seqüestro de mãe, diz polícia".

Minha opinião: sensacionalismo barato. Paixão é paixão, não importa a que sexo pertencem as duas partes.

Aliás, já repararam como o G1 adora dar destaque para matérias sobre homossexuais?

24 de jun. de 2008

Indiferença

Compa, chegou o inverno. Parece que a saudade tem termômetro, aumenta sempre que a temperatura cai. Saudade das suas idéias rasuradas sobre os restos do café da manhã, que costumavam tomar todo o apartamento, como cheiro de pão fresco no forno. Desde que te escrevi pela última vez, Ernesto ganhou sete centímetros. Está cada vez mais inquieto, como nós quando jovens. E tem aquele quê de temerosidade, que faz bem a todo revolucionário que não entrega a vida à toa. Não sei se por precoce sabedoria ou mania de perseguição, o menino inventou agora que uma nova ofensiva estadunidense está por vir. Diz ele que depois que levou bomba no Iraque, os americanos do Norte perceberam que tinham deixado os americanos do Sul livres de mais. Tão livres, que o inimaginável aconteceu: os movimentos sociais, com forte poder de persuasão popular, chegaram ao poder por via democrática. E parece que só agora Bush se deu conta de que os índios estão no poder. Ouviu bem, compa? Os índios estão no poder! A TV transmite, o jornal alardeia, mas não é curioso como exatamente quando conseguimos aquilo pelo qual lutamos há séculos, não temos forças nem para comemorar? Ou estão todos surdos ou não estão mesmo entendendo os avanços que conquistamos nos últimos anos. Talvez não seja – não é – exatamente como pensamos, mas, o menino está certo, melhor uma democracia construída por nós que uma outra imposta por eles. Há quem diga que o que está acontecendo aqui em baixo, no quintal, é fascismo. Acho que fascismo foi só um termo reinventado para dar nome aos esquemas de controle latino-americanos. Quando são os estadunidenses quem controlam, o fascismo recebe nome de democracia. Mas não tem jeito. Ernesto está com medo da contra-ofensiva e por isso tenho enjoado mais. Tento acalmá-lo, dizendo que não é a primeira vez, mas o menino está inconsolável. Quando o temor aumenta, rezo muito, para não sermos engolidos pelo fantasma da indiferença, nem sermos levados por esse discurso de que os nossos líderes indígenas são neoterroristas. Aí chegam as notícias sobre os confrontos diretos com as oligarquias na Bolívia? Falam de confrontos militares pesados, com prenúncio de um novo massacre, que certamente não será noticiado. Nunca sei em quem acreditar, não se escreve mais nas entrelinhas. Não sou mais a favor das armas, vou ser mãe. Mas também não acredito em democracia real sem luta, nem em comunhão com o neoliberalismo. Trata-se de tornar o mundo desconfortável para eles, assim como estou agora.

*Foto de Marcelo Valle

Rick & Steve


Rick And Steve at HappiestGayCouple.com

23 de jun. de 2008

Vitalidade marginal, poesia biotônica


Em 1976, saía das entranhas da imprensa alternativa um jornal de contracultura cheio de talentosos porralocas. Seu nome: Almanaque Biotônico Vitalidade. Na capa, as caras de vários “bichos-grilos” -- aos quais talvez ninguém desse o mínimo crédito. Lá dentro, 40 páginas de poesia, experimentos textuais e viagens gráficas.

No editorial-apresentação, escrito em verso (como não poderia deixar de ser), comparecia a disposição para energizar o marasmo e fazer brilhar vida num tempo em que a ditadura sombreava tudo com morte (embora se dissesse em processo de “abertura”)[1].

"(...) essência de energia pura,/o biotônico vitalidade/é composto de raízes,/folhas e frutos plenos./(...)/É muito eficaz nos casos de desânimo geral."



Seguindo a estrutura de uma bula de um remédio bom para a cabeça, o editorial apresentava indicações, contra-indicações e posologia. Almanaque Biotônico Vitalidade era indicado, por exemplo, “contra a inércia, contra a lei da gravidade, contra a contrariedade”. E ainda, confirmando sua vocação, “contra a cultura oficial”. Um remédio que “não deve ser ministrado àqueles que propõem a morte como única forma de vida”.

Os “médicos” formavam o grupo Nuvem Cigana, que trazia nomes como Torquato Neto, Chacal, Charles e outros que passaram para a história como “poetas marginais”. Um “jornal”, uma “revista”, sei lá qual rótulo, que trazia “notícias” que não caducam, como a que foi publicada na página 7, autoria de Torquato Neto.

"o Rio é lindo/ o pão daqui é uma pedra de/açúcar,/a carne não sangra o corte não/dói/tudo se esquece/o morro está infestado de bandidos/e ratos/tem um quartel da polícia no/fim da escadaria/à direita/que jeito?!/o nome é Santa Marta/um beijo"

E lá se vão 32 verões.




[1] Não esquecer que Herzog foi “suicidado” em outubro de 1975 e o operário Manuel Fiel Filho torturado e morto no início daquele ano de 76.

PS1:

Há, se a memória não me trai, dois exemplares encadernados do Almanaque para consulta no Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, que mantém um bom acervo de imprensa alternativa. Um material que vale a pena conferir.

PS2:

Topei com alguns links na internet que levam a algo mais sobre o assunto:

Portal Literal
Poesia na Rede

19 de jun. de 2008

Descobertas da semana

O "pedinte", além de ter criado a página, está espalhando nos comentários de blogs a seguinte mensagem: Por favor, visite o meu blog. Há uma razão especial para isso. Obrigado.

É a e-esmola na blogosfera! Será que alguém daria um único centavo pro Caroço? Detalhes da minha conta bancária em breve.

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E do meu amigo Freakonildo a melhor sugestão da semana. Nas palavras do próprio "agora teremos tv no quarto, na cozinha, no banheiro"! Já estou usando e funciona muito bem.

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Shake that thing!

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Tudo que voce precisa para encarar um dia frio e cinza com "bom" humor.

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Algo me diz que telefone celular não deve fazer bem...

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Em tempos de smoking ban e vida mais saudável, por que não tentar?

Promiscuidade machadiana

Esta surgiu em conversa com uma figura mitológica do jornalismo literário do Rio de Janeiro sobre o bruxo do Cosme Velho:
"O negócio de Machado de Assis era comer a mulher do José de Alencar. Tanto que há a suspeita de que Mario de Alencar seria filho dele. Mario nasceu epilético, e quem tinha epilepsia? Machado. Está tudo lá, nos diários secretos do Humberto de Campos. E a Carolina só conseguiu casar com o Machado porque já veio furada de Portugal!".

Quizz


Há cerca de um mês venho me deparando com essa imagem aí. São cartazes grandes afixados em paredes (como aqueles de shows de música). Neles há, como podem ver, duas mãos femininas, unhas grandes, pintadas de vermelho, tampando uma vulva. Uma enorme vulva depilada. E se você chegar bem perto consegue ver alguns poucos pêlos pretos crescendo nos grandes lábios. No canto inferior esquerdo tem um vidro de esmalte vermelho, no mesmo tom das unhas. Um vermelho-sangue. E a frase: “base para unhas fracas”. Nada mais. Desde a primeira vez que vi o cartaz, venho me perguntando o que será que aquilo quer dizer. Me vieram na cabeça algumas idéias:

1 – Propaganda de esmalte.
2 – Um novo grupo musical que se apresentará na Lapa.
3 – O começo de um movimento feminista (nesse caso, a imagem representa o controle da mulher sobre o próprio prazer e o próprio sexo).
4 - O pré-lançamento de novo produto ginecológico.
5 – Uma expressão artística contemporânea.
6 – Propaganda de sex-shop.
7 – Propaganda de puteiro.


Só hoje, ao escrever esse post, eu descobri qual delas é a opção correta. Alguém se arrisca?

18 de jun. de 2008

Folia às pampas!

Segue o giro das marchinhas pelo Brasil.

Com mais um carnaval e outros tantos lipídios, levamos nossa mycaretha à modda antiga a Porto Alegre, que, assim como Curitiba, se encasacou até onde pôde pra brincar num Theatro São Pedro centenário e muitíssimo bem cuidado.

“O pessoallaqui não costuma abrir este palco para eventos que não sejam de música clássica”, advertiram antes do espetáculo os mesmos foliões que, bufando de tanto pular no bis (Cidade maravilhosa), arremataram assim: “Mas quem disse que esse carnaval não é clássico?”

Isso porque eles provavelmente não provaram da Torta Goya que encontramos no Café do Margs, esta sim uma clássica. Foi criada durante uma exposição de pintores espanhóis (feita de nozes diversas, maçã e licor de amêndoas) e desde então não saiu mais do cardápio.

No affan de emagrecer (pelo menos a consciência), caminhou-se um bocado: primeiro pelos arredores do hotel, muitíssimo bem localizado, perto da Praça da Alfândega. Por ali estão a Rua da Praia (que leva ao Gasômetro, na beira do Guaíba), a Casa de Cultura Mário Quintana, o Santander Cultural e o bom mercado da cidade.

Mercado que tem como carro-chefe artigos de macumba (fortíssima por lá, ao contrário do que muitos pensam), muita erva mate e roupas de gaúcho.

Outra boa caminhada foi a que fizemos até o Brique da Redenção, onde os “bagual” se encontram no domingo de manhã pra tomar chimarrão, fazer resenhas diversas e comprar artesanato (como se percebe, feirinha de artesanato dá em tudo quanto é canto). A novidade de lá foi o quentão que bebemos às pressas pra espantar o frio minuano, além da doceria Maomé, para repor as ener... calorias (numa ambrosia de lamber os beiços).

O curioso é que chegamos ao frio do domingo (10°C de manhã!!!) depois de uma sexta e um sábado ensolarados (por volta dos 25°C). Não fosse o Climatempo, estaríamos numa pior.

...como quase estivemos nas mãos do motorista da van, que, pela forma com que ignorava o sinal vermelho (a 100 por hora!), ou era daltônico ou gremista.

De volta aos assuntos etílicos, encerro o pôste com vivas à churrascaria Na Brasa ("carne de engraxar os bigodes!", diziam os garçons), onde provei a ótima Serramalte - cerveja preferida do maestro Radamés Gnattali, ilustre filho da terra.

O clássico pode ser pop e bem vagabundinho...

Este boyzinho oriental aí ao lado é o pianista chinês Lang Lang. Tem 25 anos, é mundialmente famoso (ok, a fama na música clássica é relativa) e já está rico. Particularmente gosto dele, e aqui não vai nenhuma consideração crítica, mas adorei conversar com ele, numa entrevista há dois anos e seu concerto aqui no Rio foi bem interessante, embora não tenha sido considerado 100% pela crítica.

Chegou hoje às minhas mãos, distribuído pela Universal Music, o novo CD do astro lançado pela Deutsch Grammophon. Diferentemente da música pop, os artistas clássicos não saem com discos de inéditas assim tão fácil. A música dos compositores vivos é um capítulo à parte no meio. Por isso é preciso sempre caprichar na performance para o novo álbum não seja considerado apenas mais uma gravação, entre tantas, de concertos de Tchaikovsky, Beethoven, Mozart, etc. Apesar de Lang Lang ser uma estrela - sim, ele é - e apesar de sua gravadora ser a mais bem conceituada para este gênero musical, o disco não passa de uma coletânea bem safada, mal-cuidada. Este selo gasta os tubos em marketing, com contratos com artistas importantes, a falta de capricho com o produto é desnecessária. Uma atochação. Traz peças curtas ou parte de obras maiores, como concertos para piano e orquestra, de compositores de diversos estilos e épocas. Tudo misturado, sem qualquer unidade artística, a não ser exibir a virtuose do intérprete. Tem música para todos os gostos. Nas faixas em que o pianista está acompanhado de orquestra, não é possível saber com qual orquestra está tocando - se é a Filarmônica de Berlim ou algum conjunto obscuro do leste europeu - nem que maestro está regendo. É como comprar um disco de um cantor e não encontrar nenhuma informação sobre a banda que o acompanha no encarte.

Talvez nem todo mundo preste atenção nestas informações, mas não é por isso que a gravadora vai omitir. Além disso, o disco traz uma gravação caça-níquel de Lang-Lang com Andrea Bocelli!. Não há nada mais picareta - e brega - que Andrea Bocelli, vamos combinar que nem bom cantor ele é. Não se justifica para mim ele ter se tornado quase um Pavarotti em termos de prestigio, vendagem... Por isso, vamos tirar os saltos altos na hora de falar de música clássica e seus representantes, principalmente os estrangeiros, achando a maior erudição do mundo, coisa de intelectual. É uma indústria com suas particularidades, mas como o pop, o rock, o r&b, também pode servir ao entretenimento e ao apelo fácil do mercado.

Caroços no JB




Os coleguinhas Júlio Calmon e Anna Carolina Braile, do Jornal do Brasil, encheram esse caldo virtual de caroços na coluna BlogD, da Revista Domingo!




16 de jun. de 2008

48 horas de alienação na "sociedade da informação"


The Blindfolded, 2002 - Marlene Dumas


Sábado, duas horas da tarde, eu, Antônio e Marcelo pegamos o 996, em Niterói, e fomos em direção ao Flamengo. Já no Rio, na altura do Santo Cristo, o ônibus teve de dar meia volta, pegar um caminho alternativo para chegar ao túnel Santa Bárbara, pois o viaduto estava interditado. O motorista perguntou ao agente de trânsito da prefeitura qual seria o melhor trajeto a fazer, o agente respondeu, e seguimos em frente, nos perguntando qual teria sido a gravidade do acidente. Não consegui sentir um clima tenso no ar.

O dia passou, almoço delicioso no restaurante japonês, aniversário da sogra à noite no clima ameno da Praça São Salvador. No domingo, assistimos a uma bela apresentação do grupo Os tapetes contadores de histórias, na Caixa Cultural. Comentamos como o Rio de Janeiro é uma cidade maravilhosa, cheia de programas interessantes a preços baixos ou gratuitos (era o caso). Depois, assistimos ao documentário "Personal Che" e debatemos sobre ideologia e linguagem cinematográfica.

No sábado, o celular ficou desligado todo o tempo e pensei como era bom estar desconectada. Durante todo o fim de semana não abri a Internet e a única notícia que tive foi a morte do Jamelão, numa olhada relâmpago para a banca de jornal: o Extra deu a notícia em meia capa, enquanto O Globo ocupou um pequeno quadrado da parte inferior da página. Essa notícia não atrapalhou o clima fresco. Ao contrário, é bom homenagear o sambista que se foi aos 95 anos.

De volta a Niterói, no domingo à noite, o jornal ainda estava na porta. Peguei e deixei em cima da mesa, até a manhã seguinte, quando resolvi ler as manchetes do dia anterior, certa de que, apesar de viver na chamada "Sociedade da Informação", não havia "acontecido" nas páginas dos periódicos muita coisa que merecesse grande atenção.

No entanto, estava lá, quase 48 horas depois, o acontecimento por trás do desvio de rota que o 996 foi obrigado a fazer no sábado. Moradores do Morro da Providência queimaram um ônibus e apedrejaram outros em protesto contra a venda de três jovens, pelo exército, aos traficantes do Morro da Mineira. Não preciso comentar o caso, nem narrar os detalhes, pois o tema está sendo mais do que debatido.

No final de semana que vem, diante de outros acontecimentos, esses jovens já estarão esquecidos em meio a uma multidão de "notícias", porque a informação, nessa sociedade, tem vários pesos e várias medidas, tem cor e tem classe. Marcos Paulo, David e Wellington se tornarão apenas estatística.

Desesperançar


Depois de tanto tempo, cá estou eu, mãos trêmulas outra vez. Sei que nunca fui das mais fortes, mas agora voltou, ainda mais intenso, aquele medo absurdo de desesperançar. Espero que por aí as coisas estejam melhores, aqui está uma calmaria de dar dó. Outro dia revi nossas fotos, mexi naqueles livros... Ainda tenho as cinzas daquela réplica do Consenso de Washington, que queimamos em Porto Alegre. Mas rasguei aquelas fotos do México. Fraquejei, compa. Foi na noite em que resolvi ser propriedade privada. É, vou mesmo me casar. Juro que tentei resistir, mas não deu depois de ver tantos caírem. Porra, será que ninguém está vendo isso tudo? A defensiva acabou, querido. Ninguém resiste mais. Estou grávida. Grávida de um menino de nome Ernesto. Às vezes, quando ele está muito agitado, canto a Internacional Comunista pra ele ninar. Tão pequeno e já odeia o Pinochet, o Reagan, a Thatcher, o Blair, o Fujimori, o Menem, o FHC, o Bush...Conversamos muito, já que só posso falar dessas coisas para dentro. E ele, que só conhece o Lula corrupto e o Chavez guerrilheiro, não entende que a esquerda está passando pela mesma fase que ele, de gestação. Você também não acredita nisso? Vencemos contra aqueles ortodoxos neoliberais. O que está acontecendo agora é mero acidente de percurso. Não dá pra negar tantos avanços sociais. Sem falar na economia, no Banco do Sul, da adesão da Venezuela e da Bolívia ao Mercosul. Estamos ganhando peso, sei que estamos. E o tal do Lugo, o paraguaio? Confio nele, tem olhos de verdade, um semblante apaixonado. Quem sabe essa onda chega logo a El Salvador. Mas Ernesto não acredita. Nem ele, nem a geração que veio depois de nós. Quanto tempo temos ainda? Precisamos, compa, de uma ação enérgica com resultado imediato para cativar os de vinte e poucos. E aí a reação vem em cascata. Não vem? A velha direita, que não sei de onde tira tanta força pra resistir, agora voltou a usar o argumento da corrupção e da falência do Estado. Como se o capitalismo fosse auto-suficiente e eles não fossem os maiores corruptos de toda essa História. Filhos da puta. Gosto nem de pensar nisso, começo logo a enjoar. Será que estão todos grávidos? E você, querido, nunca pensou em ter uma família privada, só sua? A sensação é boa, mas dá medo. Medo de desesperançar.
*Foto de Marcelo Valle

13 de jun. de 2008

Você sabe com quem está falando?

Contra o câncer de colo de útero


Pesquisas científicas muitas vezes nos fazem pular de alegria. Sobretudo quando seus resultados salvam muitas vidas. Há alguns meses, já havia lido essa boa nova nos jornais. Essa semana, pude confirmá-la e saber um pouco mais sobre o essencial: como a tecnologia da ciência chega à sociedade.

Está disponível no Brasil, desde 2006, uma vacina contra quatro tipos de HPV, o Papiloma Virús Humano, uma família de vírus composta por mais de 120 subtipos. Destes, cerca de 30 podem infectar o trato genital de homens e mulheres. Alguns tipos de HPV, considerados vírus de alto risco, são os responsáveis pelo câncer de colo de útero, o tipo de câncer que mais mata mulheres no Brasil, atrás apenas do de mama. Segundo o site do Instituto Nacional do Câncer (INCA), "todos os casos de câncer do colo do útero são causados por um dos 15 tipos oncogênicos do HPV. Destes, os tipos mais comuns são o HPV16 e o HPV18. Outros fatores que contribuem para a etiologia deste tumor são o tabagismo, baixa ingestão de vitaminas, multiplicidade de parceiros sexuais, iniciação sexual precoce e uso de contraceptivos orais".

A vacina - contra os vírus 6, 11, 16 e 18 - tem 100% de eficácia em mulheres que nunca contraíram os vírus e 95% de eficácia em mulheres que já foram infectadas alguma vez (uma vez que existem 120 subtipos).

Estima-se que quase 19.000 novos casos surjam no Brasil em 2008, e que cerca de 7.000 mulheres morram no país vítimas da doença. Diante desses números, só podemos comemorar, não é mesmo?

Infelizmente, a história não é bem assim. A vacina, desenvolvida pelo laboratório estadunidense Merck Sharp & Dhome custa, em média, R$ 1.200,00 (três doses de R$ 400,00). Não há nenhuma previsão para a vacinação gratuita pelo governo brasileiro. Num desabafo com a minha ginecologista, perguntei: "Então, as mulheres pobres continuarão morrendo mais da doença do que as de outras classes?". A ginecologista respondeu que, ao que tudo indica, sim, e apesar do governo gastar muito mais com o longo e doloroso tratamento para as mulheres com câncer do que gastaria com a vacinação da população.

Não sei qual o motivo, mas a primeira hipótese que veio à minha mente é que é mais fácil desviar dinheiro público nos hospitais do que na vacinação. Uma hipótese. De qualquer forma, estimular esse debate pode servir para pressionar o governo a comprar as vacinas, ou melhor, lutar pela quebra de patente ou pela diminuição do preço na Organização Mundial do Comércio, como tem sido feito em relação aos remédios utilizados no tratamento da Aids, desde 2005.


P.S.: Mesmo vacinadas, as mulheres devem continuar fazendo o preventivo uma vez por ano. A maior parte das mulheres e dos homens infectados pelo vírus não tem qualquer sintoma.

UFRJ participa de rali tecnológico na Holanda

Entre os dias 21 e 28 de junho, uma equipe de estudantes, profissionais e professores da Universidade Federal do Rio de Janeiro, das áreas de Engenharia Naval, Engenharia Elétrica e Desenho Industrial, participará da Frisian Solar Challenge, na província de Leeuwarden, na Holanda. O rali de barcos – projetados e construídos pelos próprios competidores – envolve outros 48 times, todos europeus.

Entre os concorrentes estão as equipes do Instituto Europeu de Energia Solar e da Agência Espacial Européia. Nas 10 etapas de provas da Frisian, o desafio nem sempre se refere ao desempenho e velocidade das embarcações, mas também consiste em administrar o sistema de energia composto por painéis solares e uma bateria de 1kilowatt de potência, a qual não poderá ser recarregada depois da largada. 

A competição, além do caráter tecnológico, é também uma oportunidade para divulgar e popularizar fontes alternativas de energia para embarcações, que costumam utilizar motores de combustão. O cuidado com o meio-ambiente é relembrado mesmo nas regras do rali: é proibido transportar, nos barcos, quaisquer materiais poluentes.

Nas três categorias, A, B e C (Open) haverá primeiro, segundo e terceiro prêmio, além de um prêmio de inovação, que levará em conta aspectos como durabilidade, engenhosidade e originalidade do projeto. A equipe mais azarada do rali também receberá um prêmio. De consolação.

A embarcação, batizada de Copacabana, concorrerá na classe A. Será tripulada apenas por um piloto, mede 6 metros de comprimento e pesa 170 quilos. Os materiais utilizados em sua construção foram espuma de PVC e fibra de vidro. Os participantes receberão da organização os painéis solares da Sharp, uma das patrocinadoras do evento. Serão cinco painéis para as embarcações da classe A e seis para as classes B e C.

O Copacabana foi projetado e construído no Pólo Náutico da UFRJ, o qual funciona como laboratório de engenharia para alunos de graduação e pós, além de centralizar projetos para o desenvolvimento da indústria náutica brasileira. Entre dezenas de projetos do Pólo constam cursos técnicos de qualificação em construção naval, projetos de restauração de embarcações, desenvolvimento de tecnologia para uso de diferentes materiais e projetos para o Estado - como barcos de patrulha costeira, salvamento e resgate e fiscalização de reservas ambientais.

A construção do Copacabana envolveu também outros laboratórios da UFRJ: o Laboratório de Mecânica da Turbulência (Mecturb – Departamento de Engenharia Mecânica) , Laboratório de Concepção e Análise do Design (LabCad - Desenho Industrial – Escola de Belas Artes), Laboratório de Fontes Alternativas de Energia – Lafae – Departamento de Engenharia Elétrica), Laboratório do Programa de Planejamento Energético – PPE – Coppe e o Pólo Náutico.

Patrocinaram o projeto a MPX, a Pró-Reitoria de Planejamento de Desenvolvimento da UFRJ, a Decania do Centro de Tecnologia da UFRJ e o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica da UFRJ (Cepel).

Confira detalhes do projeto do Copacabana no blog da equipe: http://ufrjfsc2008.blogspot.com/

Assista ao vídeo da construção do Copacabana: http://www.youtube.com/watch?v=yrBo5jktgy0

Para saber mais sobre a Frisian, acesse: http://www.frisiansolarchallenge.nl

Sobre o Pólo Náutico da UFRJ: http://www.ufrjmar.ufrj.br/laboratorio.asp?id=16

Sobre projetos para o desenvolvimento da indústria e cultura náutica no Brasil: http://www.ufrjmar.ufrj.br/projetos.asp

Eu amo


De acordo com a revista Superinteressante, o site Lovelines, que rastreia em blogs expressões como “eu amo” e “eu odeio”, contabilizou em janeiro desse ano o seguinte:

1º lugar – “eu amo”, escrito por 58.638 pessoas.
2º lugar – “eu quero”, escrito por 48.309 pessoas.

“Eu odeio”, repetido apenas 15.141 vezes, está na lanterninha.

Caroço de Pequi para bocas imprudentes



É isso aí, pra quem não me conhece, meu nome é Pequi. Caryocar brasiliense para os cientistas. Ah, sei lá!Chamem-me como vocês quiserem!. Mas preferencialmente, não me chamem! Deixem-me quieto, não me importunem .


Sou fruto do cerrado. Sou acostumado com os desequilíbrios brasileiros, do planalto central e de uma vastidão de terras. Carrego em mim o exagero de chuvas do verão, dias inteiros de água, água e mais água, uma abundância um exagero, um desperdício. Trago dentro de mim a parcimônia a economia da palavra de vidas secas e a seca do fim do inverno. Aprendi a esperar como os animais da savana africana, que páram nas horas mais quentes, para baixar seus metabolismos. Aprendi que há época de vacas gordas e magras. Tem a hora de falar e a de calar.

Por essas terras, é bom saber aproveitar as épocas boas o melhor possível para aguentar , sem surtar, nas épocas de vacas magras. Este é o nosso ciclo fundante, brasileiros. E eu sou fruto disso. Como as sementes que esperam até 10 anos para germinar. Como o peixe poraquê, que se enterra na lama e espera, espera, espera. A chuva.

O que vocês aí do litoral não entendem é que nós do cerrado, das árvores tortas como as pernas do Garrincha, somos quietos, desconfiados e calados. E é bom até não abrir a boca, se você não tem nada a dizer. O ar seco daqui e do pó vermelho, que impregna cada poro de peles esturricadas de sol, poeira e secura entra mesmo nas bocas imprudentes.

É por isso que eu estou aqui, duro como um caroço. Como dissera Seneca no Senado Romano, agora eu vou falar. Mesmo que a poeira entre. Aqui vai o meu recado: é tempo de ferir as línguas incautas. Muitos esquecem que eu, Pequi, sou espinhoso por dentro, e quem vai com muita sede ao pote, seduzido pelo meu perfume inebriante, acaba ferido, pela própria ganância. Tem muita língua que se acha ferina, mas que não passa apenas de língua imprudente.

Sou caroço de pequi. Quero perfumar o ambiente caroçal, e dar uma cor ao grão de arroz, do nosso dia-a-dia. Mas não se enganem, leitores. Os incautos de línguas ferinas. vai pegar vocês. E aviso logo, vai doer. Mas a dor que o caroço do pequi provoca é a dor interna, menos pelos meus espinhos, e sim a dor da imprudência das línguas incautas.

Tá cheio aí de gente supostamente ferinas. Arnaldo Jabor, Miriam Leitão, e o líder-mor, Diogo Mainardi. Nelson Rodrigues ia gostar de estar vivo para dar uma lição nestes filhotes de polemistas. Ele ia dar uma coça de parabelo em cada um destes aí... Mas chegou a hora de reviver, com a benção de Stanislaw Ponte Preta, a observação de bobagens que assolam os que estão quietos. Neguinho vai comer caroço de pequi e vai ver a própria ligua ferida com o próprio veneno. Além do veneno do pequi

Se liga na missão!



Caroço de pequi.

Legenda

Legenda de uma foto no site G1, em galeria sobre casais no Dia dos Namorados: "André Piva e Carlos Tufvesson estão juntos há 15 anos. Fato raro no meio gay".

Verdade ou preconceito?

Quando a arte atrapalha a sua vida


O título pode parecer absurdo. Afinal, arte é alimento. O que vem dela é benéfico, sem dúvida. Mas pouco se pensa sobre o lado prático da coisa. Especialmente quando se trata de produtos audiovisuais. Vou ser mais claro: quase ninguém pára para analisar como se dá o processo de construção do objeto artístico. Não estou me referindo ao momento criativo, à inspiração, ao sofrimento para traduzir a emoção em arte. Isso todo mundo conhece.

Tampouco falo de questões práticas, tipo: a escolha da locação, a preparação do maquinário, o deslocamento de equipes e materiais, a montagem dos cenários, enfim, a produção propriamente dita. Isso é básico. Agora, o que se comenta pouco – e o que me faz pensar - é de que maneira essas produções, muitas vezes rodadas em locações urbanas, interferem no dia-a-dia da população.

Eu moro numa área naturalmente cinematográfica: a Lapa. É comum, pelo menos quinzenalmente, me deparar com todo aquele aparato: caminhões, tripés, holofotes, cadeirinhas de diretor, câmeras, gruas, trilhos, figurantes, entre outros equipamentos que eu nem conheço. Costumo andar a pé no local, e não é só para o meu lazer. Retorno do meu trabalho caminhando e inevitavelmente cruzo a região dos arcos.

Já me vi tendo que desviar muitos metros do local corriqueiro, por causa de uma novela das sete. As produções cercam áreas bastante extensas, com faixas semelhantes às da Defesa Civil. E tem sempre alguém pra avisar os distraídos: “Não pode passar por aqui!”. Como assim?? Eu estava indo para a minha casa! Eu moro ali! Já precisei andar pela rua, com trânsito intenso, para não ocupar a calçada onde era gravada uma cena da Alzira, de Duas Caras.

Recentemente descobriram que o Bairro de Fátima, onde moro, é uma boa locação de cinema. Parece um lugar do interior, tem uma pracinha linda, muitas árvores, ruas com paralelepípedos e um monte de escadarias quilométricas, que quase tocam o céu. Aconchegante e pacato. Mas hoje de manhã, por exemplo, estava tudo cercado com as famosas faixas amarelo-e-pretas. Vários caminhões, muitos figurantes, um café da manhã apetitoso servido pela produção, fora todo o maquinário.

O pessoal da cenografia construiu ali um ponto de ônibus com uma tubulação enorme, azul, passando embaixo. Os atores – que eu não reconheci – gravavam na escadaria. Eram 8h30, portanto meu horário de ir trabalhar. Mas não havia ônibus porque a praça estava "lacrada". O ponto da vida real mudou de locação, para quase 500 metros adiante. Nessa hora, eu juro que pensei: “foda-se a arte, eu quero meu coletivo".

12 de jun. de 2008

Coração imprudente

O quê que pode fazer
Um coração machucado
Senão cair no chorinho
Bater devagarinho pra não ser notado
E depois de ter chorado
Retirar de mansinho
De todo amor o espinho
Profundamente deixado

O que pode fazer
Um coração imprudente
Se não deixar um pouquinho
De seu bater descuidado
E depois de cair no chorinho
Sofrer de novo o espinho
Deixar doer novamente

Príncipe do samba, Paulinho da Viola enche a alma de lirismo nas noites de dança da solidão...

Para celebrar o Dia dos Namorados...


...aí vai uma homenagem ao meu amor Julian Casablancas, que está um arraso (como de costume) cantando com Santogold e N.E.R.D.


A Converse conseguiu unir o trio em "My Drive Thru", single produzido em comemoração aos 100 anos da marca. O resultado está disponível para download aqui. E é grátis. E vale a pena.

Mulher-banana


Dentro do mesmo ônibus:

- Você viu? Agora aquele menino que dançava com a mulher melancia dança com a mulher melão.

- Jura? Melão?? Mas por que melão?

- Ah! dizem por aí que a menina tem uns super melões turbinados...

- Sei, acho que vi ontem uma foto dela, quer dizer, deles, num desses jornalecos de terceira.

- Pois é menina, uma loucura isso, né? Aonde será que o Brasil vai parar?

- Olha, acho isso um absurdo! Daqui a pouco vai ter a mulher-uva, mulher-goiaba, mulher-limão...

- Credo! Só quero ver quando encontrarem a mulher-banana: levanta a tanguinha e ó... Olha a Banana!! rárárárárá

- Rá rá rá... Melhor deixar isso com o Ronaldinho....

Da série Impressões: Solidão

"Não preciso! Não preciso mermo. Ninguém merece isso! Não preciso disso", murmura a mulher sentada que pega meu dinheiro e devolve uns trocados. Passo na roleta e ela continua: "Não preciso disso, cara. Não preciso ficar ouvindo isso de homem. Fica enchendo meu saco, pô! Não preciso, mermo". Estava comendo um tangerina e cuspia o coroço no motorista, com força. Tinha lá seus 40 anos, era mulata, cabelo curto, jeitão malandro. Batia no banco e continuava "Ele tá pensando o que? Num preciso mermo não". Toca o celular. "Alô, alô... Alôooo. Oi, num to ouvindo, fala mais alto", o motor do ônibus rugia e ela continuava: " Ah! Que saco. Vou jogar essa porra no lixo. Não ouço nada, rapá". Tirou um outro celular da pochete e tentou ligar para o mesmo número que ligara pra ela. "Alô, alô! Foi você quem me ligou, né? É ela mesma. Quem está falando? Hein?????!!! Quem é que ta falando? Ó, num vou fala mais nada enquanto tú não falá quem é que ta falando aí". Desligou. Pegou o outro celular e começou a ligar. "Num atende... Eu hein?", resmungou em voz baixa. O telefone tocou novamente: "Alôooooooo.... Oi, ah, é você. Me ligou outro dia, né? Hummm, to ouvindo não.... Merda!! Agora eu jogo fora essa merda. Que bosta esse celular. Ah! Quer saber, num atendo mais. Ô fulaninho, qué a tangerina aqui? Tó! Foda isso, né? Tô te falando que eu não preciso".

11 de jun. de 2008

Obra em progresso

Para quem quer curtir as sempre bem calculadas alfinetadas do Caetano Veloso, que sempre nos fazem pensar e aprender algo, vale a pena visitar o "blog-vídeo" www.obraemprogresso.com.br. Mais inteligente e divertido que nunca.

Orgulho academico e carioca

Gisele Maia, uma das colaboradoras desse blog, é assessora de um projeto interdisciplinar bem bacana e inovador da Universidade Federal do Rio de Janeiro e acaba de colocar no ar um vídeo que mostra a construção do barco ecologicamente correto. 

O barco, que ganhou o nome de Copacabana, parte amanhã (de avião!) para a Holanda, onde participará de uma regata e é o único concorrente não-europeu.

A competição premiará a eficiência no aproveitamento da energia do sol convertida em eletricidade por cinco painéis instalados no convés.

10 de jun. de 2008

Maré - Adriana Calcanhotto

É bem difícil examinar com proximidade o novo disco de Adriana Calcanhotto mais que ela própria fez em seu site. (Ainda falo disco, em vez de CD, que já está ultrapassado...)

Neste CD (que, embora tenha a novidade de uma formação quase de banda - com o grupo +2 -, ressoa todos os outros de Calcanhotto), ela conseguiu que uma leve imagem unisse todo o disco, talvez por isso o mais bem acabado. Essa ligação entre as músicas ela mesma sugere quando denomina o CD de "Maré". Se os outros discos possuem músicas mais fortes, como "Mentiras", "Esquadros", "Cariocas", "Vambora", "Metade" e "Cantada", neste fica evidente aquilo que é possivelmente o principal diferencial da artista (não apenas cantora ou compositora): a união inteligente entre a palavra poética e a música.

Sem querer entrar na falsa questão de se letra de música é ou não poesia, vemos em "Maré" diversas possibilidades do uso da palavra poética conjugada com música. Temos desde "Um dia desses", poema de Torquato Neto musicado por Kassin, até "Sargaço mar", possivelmente a música mais poética de Dorival Caymmi. Entendam o "poético" aqui por aquela definição mais comum: a palavra que problematiza seu próprio significado. A letra de "Sargaço mar" é desses momentos em que a palavra mostra que pode significar mil coisas além dos significados comuns: "Quando se for/ esse fim de som/ doida canção/ que não fui eu que fiz/ verde luz verde cor/ de arrebentação/ sargaço mar/ sargaço ar". A bela passagem do sonoro (fim de som) para o pictórico (arrebentação) tem um efeito multiplicador sobre a palavra "verde" - certamente um dos momentos mais bonitos (e talvez mais difíceis) do cancioneiro de Caymmi.

Cabe ainda dizer que a ligação entre este disco e os anteriores se faz não apenas pelos timbres - e principalmente pela batida do violão de Calcanhotto -, mas também pelo que parecem ser citações de músicas anteriores. "Maré", que abre o CD, inicia com uma bateria que lembra o início do disco "Adriana Partimpim"; o violão e a vocalização da introdução de "Mulher sem razão" lembram a música também de Dé Palmeira, Bebel Gilberto e Cazuza que ela havia gravado em "Maritmo", "Mais feliz".

"Maré" também recupera "Maritmo" no título, mas a referência ao mar assume uma ressonância muito maior, não só por estar mais presente no disco como pela expansão de significados. Em "Maritmo" o mar era identificado a um lugar (além do Caymmi de "Na beira do mar", o Rio de Janeiro da música "Maritmo"). Agora, aquilo que é líquido (o mar) assume outros sentidos, como a distância ("A uma hora dessas/ por onde passará seu pensamento/ Por dentro da minha saia/ ou pelo firmamento?") e o desejo ("Só meu sangue sabe tua seiva e senha/ e irriga as margens cegas/ (...) sendas de tuas grutas ignotas"), mas, como na música "Maré", no final a certeza é de que o mar de Calcanhotto "é só linguagem".

*

P.S.
Acho que isso foi o que mais me marcou da audição do disco, mas é bom destacar o "tango moderno" de Marina Lima e Antonio Cicero "Três", num clima parecido com "A outra", do Marcelo Camelo; e a recuperação da música "Mulher sem razão", da qual eu não me lembrava. Quando comecei a ouvir a gravação desta música em "Maré", a melodia de "Sem aviso", de Fred Martins e Francisco Bosco, que a Maria Rita gravou, vinha à minha mente junto com o primeiro verso ("Saia desta vida de migalhas") .

foto: Leonardo Aversa (copiada sem autorização do site de Adriana Calcanhotto)

9 de jun. de 2008

De volta ao Pantanal!!!


O som do berrante e dos tuiuiuis pegou muita gente de surpresa hoje e o deja vù era real. Silvio Santos, cagando solenemente para a pendenga com a TV Globo, pôs no ar o primeiro capítulo de Pantanal, novela de Benedito Rui Barbosa com direção de Jayme Monjardim, sucesso estrondoso da dramaturgia brasileira exibida em 1989/90, que derrubou a audiência da vênus platinada. Eu estava ansiosa. Há algumas semanas a emissora presidida e comandada como um centro esquizofrênico pelo homem do baú vinha exibindo uma propaganda bizarra anunciando uma tal "arma secreta". A tal arma iria ao ar hoje, às 22h, informava a grade de TV informada pela emissora. Logo depois do almoço, fuçando a internet, vi uma nota escondida no UOL sobre rumores de que a tal arma era Pantanal e que ela iria, sem aviso, ser exibida a partir de hoje.

Protagonizada por Cristiana Oliveira, como Juma Marruá, Claudio Marzo, Marcos Winter...Pantanal marcou época. Tinha aqueles planos enooormeees, aquela música brega do Marcus Vianna ao fundo, sequências lentíssssimas. Coisa de cinema. Uma história incrível, bem diferente das novelinhas batidas que a Globo produz até hoje. Na minha casa era a maior briga, minha mãe e meus avós não gostavam que a gente assistisse Pantanal porque havia muitas cenas, digamos, adultas. Mulheres tomando banho de rio todo capítulo...além do mais, a gente tinha apenas uma televisão, e os mais velhos tinham a preferência. Saco. Jayme Monjardim foi para a Globo, tentou, tentou, mas nunca mais conseguiu reproduzir o efeito visual inovador de Pantanal.

Recentemente, Sr. Abravanel comprou da massa falida da extinta TV Manchete, com autorização a justiça, todas as fitas da novela. Há poucos dias, a TV Globo anunciou a compra dos direitos da novela e prometeu um remake da trama da mulher que vira onça para o ano que vem. Se um tem as fitas gravadas e o outro os direitos sobre o texto, quem poderia, então exibir a novela? Silvio não esperou a situação ser esclarecida: mandou apertar o play. Ele não está com a razão. Os atores que participaram das gravações ficaram com a orelha em pé e iniciaram uma movimentação quando a notícia da venda das fitas, afinal, ninguém autorizou os direitos de imagem, já que se tratava de um projeto secreto. Até a noite de hoje os funcionários do SBT diziam nào saber de nada sobre a veiculação ou não da novela. Nenhum comercial foi vendido. Apesar de todas as rebarbas que esta jogada deixa sobrando, tenho de confessar que adorei a ousadia de Silvio Santos. Ele não decepciona jamais!!!!! Agoniza mas não morre!!! Destemido, o ex-vendedor ambulante que criou um império televisivo provou a todo mundo que não tem medo da enorme batalha judicial que vai enfrentar contra a todo-poderosa. Demais, né?

Fãs fiéis da novela entraram no maior alvoroço em comunidades, sites e listas de discussão na internet sobre o tema. Um cara tá vendendo igual água a coleção de 65 DVDs com todos os capítulos do folhetim. Satisfação garantida ou seu dinheiro de volta: o tal detentor da raridade não é um picareta. Está vendendo muito pois ninguém duvida de que a novela pode ser interrompida a qualquer momento.

Ah, o Patrão é fogo.

Para os interessados na história da televisão no país e pesquisadores, uma boa nova chegou à internet no fim de semana. A Rede Globo colocou no ar um site com informações, vídeos, fotos e depoimentos sobre seus programas jornalísticos e de entretenimento. A página ainda está incompleta. Mas, para quem já tentou fazer pesquisa neste país sobre arquivos audiovisuais de TV, sabe o quanto é importante uma iniciativa como essa, mesmo que ainda incompleta.

Navegando no site, temos acesso às aberturas de todas as novelas da emissora, além de uma sinopse detalhada das histórias, depoimentos de atores, curiosidades e fotos. É pouco, se pensarmos que no youtube encontramos a cena da famosa briga entre Joana Fomm e Sônia Braga no último capítulo de Dancin' Days (coisa que o site da Globo ainda não pôs à disposição), mas muito se tentarmos procurar por aí mais detalhes sobre a dramaturgia da TV.

Para os fãs novatos de Big Brother Brasil, que viram só o último e se lamentam por ter perdido os primeiros (estou entre eles, faço a confissão pública), estão lá imagens e informações sobre todas as edições do programa.

Outra curiosidade são as reportagens do Jornal Nacional veiculadas na íntegra. Quem quiser rever o JN do dia do impeachment do presidente Fernando Collor, ele está lá. Revendo o programa, lembramos que o Renato Machado, hoje apresentador do Bom Dia Brasil e especialista em vinhos do programa culinário do Claude Troisgros, era setorista do Palácio do Planalto. Podemos perceber também que já naquela época, o Pedro Bial arriscava seus versos em cadeia nacional, cobrindo as manifestações em Brasília. Délis Ortiz e Heraldo Pereira, hoje comentarista político, já estavam na cobertura política, mas a repórter ainda não podia usufruir dos poderes do formol e da escova progressiva.

Tentei ver o JN da posse do Lula (outro dia, a amiga Helena Aragão me perguntou se no Globo haveria alguma cópia do programa. Será que ela conseguiu achar algum petista por aí que tenha gravado?), mas as imagens ainda não estão disponíveis, embora haja um resumo escrito da cobertura naquele dia. Nem todos os links funcionam, mas é de se esperar que o projeto tenha andamento e que, aos poucos, comecemos a ter acesso a mais e mais imagens (isso é verso de música, não?).

Outra coisa interessante é que o site pôs um link para os lances polêmicos da emissora, aqueles que estudamos nas faculdades de jornalismo. O caso Proconsult, a edição do debate Lula-Collor, o caso Time-Life, a cobertura das Diretas-Já. Estão todos lá, com imagens e uma tentativa de argumentação de defesa da emissora. Vale muito a pena ver, e criticar de novo.

Exposição Fotográfica Olho Vivo - 5 anos

A Clau já divulgou, mas faço o convite de novo. A inauguração da exposição fotográfica do grupo Olho Vivo, assessorado pela Bem TV, acontece amanhã, às 19h, no Espaço Glia (R. Nilo Peçanha 142 - Ingá - Niterói).

Apareçam!

Cinema-mulherzinha


Chame suas melhores amigas, vista uma roupa estilosa, dispense o namorado (se ele estiver viajando, melhor ainda) e entre na sala de cinema com uma pipoca bem grande e um copo de coca-cola. "Sex and the city" é para ser visto assim. Não é preciso conhecer nem ser fã da série para se identificar, imediatamente, com a história das quatro quarentonas (elas deixaram a idade de Balzac há tempos) em busca de sexo, amor e paixão na glamourosa Nova Iorque.

O filme tem figurinos lindos. Os sapatos da Carrie fazem qualquer balzaquiana com problema nos joelhos esquecer a dor e subir no salto. Suas roupas deixam as gordinhas mortas de inveja! Os vestidos da Charlote inspiram as românticas e as mamães em primeira barriga. As cores extravagantes da Samantha e até as roupinhas menos inspiradas da Miranda também são destaque num filme em que a moda é um dos principais personagens.

Mas, o que chama a atenção mesmo é a força da amizade. Esse é o mote, mais que as paixões, o sexo, os problemas com filhos e maridos. Na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, lá estão as quatro a se consolar ou a festejar alguma coisa. Todos os outros temas são o tempero dessa união, que não é abalada por nada neste mundo. Por isso, "Sex and the city" me emocionou (tudo bem, no meu estado, ando chorando à toa). Eu estava com uma grande amiga do lado. Mas todas as outras estavam ali comigo, em pensamento.

Meninas, corram para o cinema.

6 de jun. de 2008

DICAS CULTURAIS

Nesse fim de semana temos algumas opções culturais bem bacanas

Dêem uma olhada:

- Festival de Teatro da Língua Portuguesa: http://www.talu.com.br/festlip
De 4 a 15 de junho o evento reúne grupos de Angola, Moçambique, Cabo Verde, Portugal e Brasil e promove o intercâmbio cultural com exposição, oficinas teatrais, palestras, leitura dramatizada, mostra gastronômica e musical.

- Rio Folle Journée: http://www.riofollejournee.com
Uma maratona de música clássica em vários teatros da cidade com ingressos de R$ 1 a R$ 5. Este ano o festival homanageia o compositor Beethoven.

Leia o Post de uma coleguinha que foi a abertura da programação e ficou impressionado.

- Sex an d The City - o filme
Bom, eu nunca vi a série, mas como quase toda mulher moderna caiu de joelhos ao ver Carrie, Charlotte, Miranda e Samantha, ok, vou ver o filme. A quem interessar, neste link tem uma entrevista com Sarah Jessica Parker, protagonista e produtora do longa.

- Maratona Odeon BR
Hoje é dia de Maratona na Cinelândia. A festa já é velha dos cariocas e, continua uma boa oportunidade para dançar, ver alguns filmes bons, conhecer gente bacana e ainda tomar um café da manhã numa das salas de cinema mais lindas do Rio. Para saber sobre a programação clique aqui.

- Orquestra Conteporânea de Olinda
O grupo é o encontro de músicos de diferentes gerações que estudaram liguagens diversificadas da musica pernambucana, ou seja, brasileira. Criada em meados de 2006 por Gilú, apelido do percurssionista Gilson do Amaral, a Orquestra tem a especial finalidade de criar novas concepções sonoras. Quem estiver interessado entre no myspace dele para entender melhor.

Os músicos: Maciel Salú (vocal e rabeca), Tiné (vocal), Gilú (percussão), Hugo Gila (baixo e teclado), Juliano Hollanda (guitarra e viola), Raphael Beltrão (bateria), Maestro Ivan do Espírito Santo (sax alto, barítono e flauta), José Abimael (trombone), Lúcio Henrique (sax alto), Adriano Ferreira (trombone) e Alex Santana (tuba). Os seis últimos são integrantes da Orquestra Henrique Dias, Fundada em 30 de abril de 1954.

Show de lançamento do CD de estréia será neste sábado, 7 de junho, às 22h, dentro da programação da festa Ronca Ronca, no Estrela da Lapa.

Nos veremos por aí ;o)

Semente de Conto - EPIFANIA TRICOLOR



Quatro minutos do primeiro tempo. As oitenta mil cabeças submersas na forma oval assistiam, extasiadas, ao vaivém de bolas amarelas no gramado. As mãos se encontraram na tentativa de alcançar o balão vermelho. Veio a nuvem de arroz e ele lhe ofereceu a camisa para proteger o rosto. O suor brotou farto pela testa até alcançar a virilha. A bandeira tricolor desceu inteira sobre os dois, protegendo-os de si mesmos. Doze minutos do segundo tempo. Inconsolável, ele caiu. Ela lhe devolveu a camisa, cobriu suas costas com as mãos. Os seios roçaram o braço direito. As pernas trepidaram e as línguas se encontraram. Dezoito minutos, gol de Washington. Os mamilos encontraram o peito de frente. Morderam-se os lábios em profano silêncio. Nova nuvem de arroz e o corpo inteiro ficou anestesiado. Vinte e seis do segundo. Conca, Conca, Conca, e as mãos encobriram toda a cintura, dedos já na altura do ventre. O espaço entre o vão das pernas dele ganhou forma, ela ardia por dentro. Faltou-lhes o ar. Quarenta e sete. Dodô! O manto tricolor caiu sobre as cabeças e se amaram ali, na íntima comunhão de um Maracanã lotado.

Acontecimentos reais.2


Foto: Keryllyn de Souza

"Sejam sinceros: nunca lhes passou pela cabeça querer ver-se vivendo? Vocês só querem viver para si - e fazem muito bem- , sem pensar no que poderiam ser para os outros; não porque não lhes interesse a opinião alheia, que lhes interessa enormemente, mas porque vocês vivem na feliz ilusão de que os outros, de fora, os percebem da mesma forma como vocês se percebem."

(Pirandello Um, nenhum e cem mil)

Coisas estranhas acontecem na normalidade da casa. As formigas não gostam de açúcar, preferem se infiltrar na garrafa de café. Todas as manhãs, ela é obrigada a repetir o mesmo gesto. Abre a garrafa, assassina as formigas com a água da torneira e depois joga água fervendo para limpar os vestígios. Ela pensa que sociedade secreta das formigas é essa que resiste às suas investidas.

Freqüentemente, também, os objetos somem ou mudam de lugar. Ela deixa o livro na mesinha de cabeceira, antes de dormir, e ele amanhece no sofá da sala. Certa vez, procurou sua certidão de nascimento, guardada há 35 anos na caixinha de recordações que sua mãe lhe dera, e ela não estava mais lá. Precisou ir ao cartório para recuperar sua existência.


Seu marido teima em lhe dar explicações científicas ou, ao menos, plausíveis, para as coisas estranhas. Trouxe, certa vez, um recorte de jornal que falava de uma espécie de formigas - a Faraó ou Monomorium pharaonis - que procuravam lugares na casa onde pudessem se aquecer, como os aparelhos eletrônicos. Logo, concluía o marido, as formigas entravam na garrafa de café em busca do calor.


Sobre os livros, ele jurava que a mulher era sonâmbula e que lia nas madrugadas, no sofá, embora ela não se lembrasse de nada e o marcador continuasse na mesma página em que ela havia interrompido a leitura antes de dormir. A certidão, obviamente, foi comida por traças, as traças de livros da espécie Acrotelsa collaris (Fabricius), que gostam de papel com cola, como a certidão que havia sido desprendida de um livro de anotações de bebê.


Um dia, ela olhou no espelho, mas viu a imagem de outra mulher. Chamou o marido. “Quem você está vendo ali?” “Ora, você”, respondeu o homem. “Não, não sou eu. É outra mulher. Agora me explique essa coisa estranha”. Diante do espanto do marido, desafiou: “Então descreva, detalhadamente”. O marido expôs minuciosamente os traços, contou as rugas, filosofou sobre a textura da pele e os desenhos do cabelo.


Dessa vez, ele não conseguiu solucionar o mistério. O que suas palavras descreviam era a outra mulher.