Acabei de postar o texto anterior e me dirigi a uma livraria, para comprar mais um livro para o mestrado. Enquanto aguardava o vendedor trazer o exemplar, chamou-me a atenção, entre as centenas de livros das prateleiras, uma lombada fina, num tom de azul que já está sendo chamado, na gíria dos mais jovens, de "azul Orkut". (Aliás, fica a dica para as editoras. Deve ser uma boa estratégia de visibilidade imprimir títulos com as capas azul Orkut, verde MSN ou na estética clean do Google.)
Trouxe para casa, além do que fora comprar, Leitores, espectadores e internautas, recém-lançado livro de Néstor García Canclini que, a meu ver, continua o assunto do post anterior, que se pretendia mais focado nas formas de ler do que na questão do tempo, como preferiram os leitores que deixaram comentários.
O livro é composto de pequenos fragmentos ensaísticos, organizados em ordem alfabética, que nos remetem a noção de hipertexto. Podemos ler os textos em qualquer ordem, ir e voltar. Não há, também, uma pretensão em oferecer respostas, mas um incentivo a que façamos perguntas, como sugerido pelo autor no fragmento "Dicionário": "Não seria mais útil um dicionário dedicado a focalizar pequenas partes e dizer algo que se pudesse saber de cada coisa? Poderia acompanhar cada palavra só com perguntas. Cada artigo seria uma breve entrada na penumbra ou na claridade de um momento ou, ainda, a expressão de estranheza produzida ao ver-se iluminado esse fragmento. A melhor definição não buscaria somar-se a outras para ir ampliando o panorama do saber, mas, sim, tornar visível o que brilha por uns minutos. Também o que fica interrompido ou oculto entre uma definição e outra. Trabalhar com noções embora ainda não sejam conceitos, essas que usamos apesar de não estarem no dicionário".
São várias as perguntas que somos incentivados a fazer, pensando a globalização no que tem de dominação e de resistência, mas quero me deter só na questão que dá título ao livro. Que novos hábitos culturais, que novos tipos de experiências acontecem agora que somos, ao mesmo tempo, leitores, espectadores e internautas? Ou a partir de que critérios devemos pensar esses novos hábitos culturais agora que somos leitores de livros, revistas, quadrinhos, legendas de filmes, cartazes publicitários, bulas de remédios, blogs, e-mails e mensagens de celular?
Canclini, questionando teóricos críticos da comunicação, elogia as formas de resistência que se desdobram em "ações espetaculares"; pergunta a quem não serve ser internauta, já que convivem no espaço virtual novas formas de sociabilidade e de se fazer política, junto a novas formas de transtorno e destruição; apresenta pesquisas feitas em vários países do mundo que mostram que as formas tradicionais de leitura e a leitura na internet, ao invés de se excluírem, se complementam (os dados apresentados batem com resultado da pesquisa "Retratos da leitura no Brasil", lançada recentemente pelo Instituto Pró-Livro).
Se somos, ao mesmo tempo, espectadores, leitores e internautas, "por que as campanhas de incentivo à leitura são feitas só com livros e tantas bibliotecas incluem somente impressos em papel?"
O volume foi editado pela Iluminuras, dentro da coleção "Os livros do observatório", parte do projeto Observatório Itaú Cultural, beneficiado pela Lei de Incentivo à Cultura do MinC. Esses dados são relevantes se pensarmos que uma das críticas presentes no livro é exatamente a mercantilização cada vez maior da cultura. Chamam a atenção, a meu ver, para algumas das contradições de nosso tempo. A crítica à globalização econômica ganha voz através de um dos maiores símbolos e beneficiários deste processo, um banco privado. Além disso, chama atenção uma fato já questionado por mim algumas vezes neste blog: o dinheiro público subsidiando as ações sociais e culturais (diretamente ligadas às ações de marketing) das empresas privadas.
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