Enquanto a multidão tricolor se equilibrava sobre os braços das cadeiras, maldizendo o pescoço pequeno demais para alcançar o gramado, ele permanecia sentado, cabisbaixo, com as mãos espalmadas sobre o chão. Sentiu o cheiro da fumaça dos fogos de artifício, brincou com o vapor de pó de arroz que envolveu sua nuca, segurou o peito ao ouvir o forte apito inicial. As cadeiras todas rangiam ao mesmo tempo, com o incansável trotar de 160 mil pés. Se agarrava como podia ao chão já lavado de suor e cerveja, rei absoluto da área do Maracanã que se via desde abaixo do joelho. Apesar de extasiada com o espetáculo tricolor, uma força maior, quase mágica, atraía meus olhos em direção a ele. Trinta segundos antes do gol adversário ser anunciado, ele soltou um urro de desespero. Logo em seguida, a multidão o acompanhou. Na tentativa de driblar a dor pela inesperada ameaça de derrota, afastei os olhos do gramado e comecei a assistir ao espetáculo pelos olhos dele. E vibrei, em insana euforia, trinta segundos antes do primeiro gol tricolor e outros trinta antes do segundo. Emocionada, lancei-me também ao chão, que se movia tal qual mar revolto. Esperava com a ansiedade da criança que aguarda o presente de Natal o celebrar precipitado daquele humilde profeta, coberto por uma bandeira rasgada e quase incolor. Trinta segundos antes do terceiro, chorei de felicidade, abraçada aos meus, pedindo a Deus um último vibrar profético daquele santo libertador. Mas trinta segundos antes da partida terminar, ele tirou os óculos escuros e exibiu duas pupilas enxarcadas e tão brancas quanto a sigla do Fluminense estampada na velha bandeira.
3 de jul. de 2008
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3 comentários:
Só você para, com palavras maravilhosas, extrair o melhor e o inusitado da festa e da tristeza de ontem... Melhor escritora do mundo
Belíssimo texto; vou republicá-lo no Balaio. Saudações tricolores.
Lindo, Lu.
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