18 de mai. de 2008

Quem poderá intervir?



“Planeta: a Terra.

Cidade: Tóquio.

Como todas as metrópoles deste planeta, Tóquio está hoje em desvantagem na sua luta contra o maior inimigo do homem: a poluição. E, apesar dos esforços de todo mundo, pode acontecer que – um dia – a terra, o ar e as águas venham se tornar letais para toda e qualquer forma de vida.

Quem poderá intervir?

SPECTREMAN!!!!”

Era assim que sempre começava um episódio do Spectreman, depois daquela abertura que tinha uma música muito legal (e sobre a qual eu sempre falava: “Quando tiver uma banda, vou fazer uma versão dessa música...”).

Eu devia estar sentado no sofá, tirando meleca e coçando o saco ainda moleque.

Acho que passava na TVS (hoje SBT), ou também passou na extinta TV Manchete... não sei. (Acho que lá era o concorrente... o Ultraman).

Monstros gigantes, cenários toscos, a inconfundível vitória do Bem contra as forças do Mal.

Doutor Gori e sua risada ameaçadora, no fundo, não ameaçavam ninguém.

Nosso herói, Spectreman, trajando seu coletinho mal passado, era mais do que um super-herói. Pela introdução, ele já assumiria a responsabilidade de um ambientalista ferrenho, a defender o planeta da louca voracidade da industrialização.

Em Kyoto, anos mais tarde, Spectreman, com sua identidade humana de Joji Gamu, estava na platéia. Já com uns 50 e poucos, bem acabadaço, não teve forças para reagir. Sua história de bons serviços à Divisão de Pesquisa e Controle de Poluição não foi considerada. Ele pediu a palavra, mas foi solenemente ignorado pelos chefes de Estado presentes. Caiu na real e viu que o jogo estava perdido.

Desesperançoso, Spectreman pegou um trem-bala até Tóquio e seguiu a viagem acompanhando um show de bizarrices na TV em frente de sua poltrona. Quando desceu, resolveu comprar calcinhas usadas de colegiais nipônicas numa dessas lojas para japas de meia idade que se amarram em calcinhas suadas de colegiais nipônicas.

Em casa, jogou os sapatos para longe e ligou a TV. Ficou vendo alguns desses desenhos japoneses. A luta, agora, se colocava em mundos paralelos, distantes do cof-cof, dos engarrafamentos, das buzinas, das colegiais. Um mundo fantástico e asséptico.

Ele se sentiu um panaca, um palhaço a serviço de um país que mata baleias em nome de “valores culturais”.

Ele foi até o quarto. Abriu o armário e pegou uma caixinha. Tirou lá de dentro um pouco do haxixe que um amigo filipino havia descolado com um conhecido indiano que fazia hora-extra numa fábrica que fazia peças para aparelhos da Sony. Preparou o fumo e tocou fogo.

Pegou uma fita VHS empoeirada e colocou no videocassete.

Ele se sentou no sofá.

Começou a viajar no episódio em que ele pegou uma barata gigante pela antena e atirou longe, indo cair naqueles prédios toscos feitos de papelão, ou coisa parecida.

Deu uma boa risada. Depois, tirou uma meleca e coçou o saco velho.

E pensou alto:

- E agora? Quem poderá intervir?

Um comentário:

Cláudia Lamego disse...

Adoro essas imagens toscas de coisas antigas. Eu não via isso, porque era menina e tinha medo!

JH, só você para vislumbrar vanguarda ambientalista no Spectroman! Em tempos de discussões chatas sobre o legado de 68, esse foi um achado!