9 de set. de 2008

Será que sempre foi assim?

Bem, depois de um furto, a sensação de vazio é normal, a rápida atitude de cancelar cartões e retirar novos documentos também. Pois bem, depois de sumirem (gatuno profissional) com a minha bolsa na Lapa, decidi dar queixa numa delegacia mais simpática e menos movimentada do que a 5ª DP, na Lapa. Fui ao Catete. Chego e peço para fazer o B.O., eles pedem para eu esperar um pouquinho. Logo depois, e até bem rápido, a menina da triagem em atende e pergunta o que houve. Eu explico que furtaram minha bolsa na Lapa. Ela pergunta "o sujeito estava armado?" "Não meu amor, foi um furto. Eu nem vi o meliante" "Ah tá". De repente surge um homem caminhando lentamente. Pega o papelzinho e chama: "Germânia?" "Não inspetor, Gardênia". Aqui já percebi que paciência seria meu trunfo nessa missão.

Como é que alguém pega um papel, no qual, em letras garrafais, está escrito um nome, no caso, G-A-R-D-Ê-N-I-A, e lê Germânia? Na boa, já sofri demais por conta do meu nome (que hoje acho lindo e blá blá blá) mas, façameofavor, não dá pra ver Gardênia e ler Germânia, né?

Enfim. Sento na cadeira precária da delegacia precária e, na mesma hora, o homem barrigudo bem precário senta à minha frente. Percebo que o inspetor Fábio é jovem, não deve passar dos 35. Na mão esquerda exibe uma aliança esmagada, daquelas que só saem arrebentadas por um alicate. Pensei: "esse é do tipo que engorda cem kilos depois de casar". De repente fui interrompida pela voz ríspida de Fábio:

- Olha, esse registro só vai ficar pronto depois de 4 dias. Você só vai poder pegar sua cópia na sexta-feira.

- Mas eu não levo nenhum outro documento que comprove que fiz um Boletim de Ocorrência? – retruquei com cara de desentendida.

- Não.

- Mas eu preciso...

- Vou anotar aqui o número do registro, você vem na sexta e pega.

- Mas e enquanto isso? Não dá pra fazer nada sem o B.O.. Preciso ir ao banco, Detran, tirar CPF, identidade, meu celular...

- Ah minha querida, eu não posso fazer nada. Agora é assim. Paciência.

Olha ela aí. Paciência. Eu não disse que seria meu trunfo. Respirei bem fundo. Chamei Buda, Jesus, Xangô, Oxalá, Maomé e tudo quanto foi santo pra me ajudar.

- Mas... Você não pode me dar algum papel timbrado que comprove o meu registro? Daí...

- Menina! Você não me ouviu?! Eu só cumpro ordens. O delegado decidiu que só vai liberar depois de quatro dias, e é isso! Entendeu bem? – bravejou bem alto o moço da barriga enorme batendo na mesa e com olhar de assassino.

Confesso que fiquei com medo nessa hora, me tremi toda. Minha mã começou a suar. Mas minhas reações nunca são as melhores. Olhei bem pra ele e disse com o coração pulando:

- Eu sei que você SÓ cumpre ordens. Mas pense na minha situação. Fui roubada. Levaram todos meus pertences de uma só vez. Venho à uma delegacia que, teoricamente, é um lugar de proteção à vítima e, você me agride? Não estou entendendo. Você acha que estou aqui por que penso em recuperar minhas coisas? Eu preciso mesmo é desse B.O. para minha vida andar. Só quero entender por que não posso levar agora. Não pode me dar uma resposta do tipo "por que não". Não sou burra...

Nesse exato momento, eis que surge um outro inspetor. Mais velhor, com ar de experiência e uma feição mais doce – se é que é possível candura numa delegacia. Segurou o ombro do gordão e disse olhando pra mim:

- Você não vai poder pegar sua cópia hoje por que a queixa devia ter sido feita na Lapa. Lá você teria acesso rápido.

- Então pára. Por favor. Eu vou agora mesmo até lá.

- Agora não dá mais. Eu já comecei – se meteu o inspetor Fábio que, com um sorriso sarcástico no canto da boca, continuou - Já gerei o número e agora não tem mais como voltar atrás.

- Então eu acabo aqui e vou lá fazer outro registro – respondi rápido.

- Você vai fazer duas ocorrências do mesmo roubo? – se espantou Fábio, o inspetor barrigão.

- Sim, claro. Se é isso que preciso fazer para ter o documento que quero, não tenho a menor dúvida.

- Mas...

- Você não precisa ir até lá, não. O delegado vai fazer um despacho para a 5ª DP e despacha seu B.O., daí você já leva sua cópia, ok? – disse o homem bom de barba grisalha e bem mais magro que o mais novo.

Silêncio.

- Pronto. Acabou. É só isso. Tchau! – se despediu o inspetor Fábio, o da barriga enorme.

Olhei para o lado, levantei e procurei o cara da barba grisalha. Respirei, abri o maior dos sorrisos de gratidão: "Muito obrigada". Saí da delagacia com vontade de morrer, sem entender como a vida se tornou assim, tão hostil.

5 comentários:

Gugu disse...

Garden, o trauma da delegacia parece ter sido bem pior que o do furto... Onde vamos parar??

Andressa Camargo disse...

Pelo menos o trauma gerou um texto bacana. Precisamos ver as coisas pelo lado bom..... quer dizer, faça o que eu digo, não faça o que eu faço. Certamente, minha reação teria sido bem pior do que a sua! Hahahahahahah.

Gabriel Cavalcanti da Fonseca disse...

É Germânia. Gostei muito do texto, só não entendo o conceito de delegacia mais simpática. Acho que não consigo colocar delegacia e simpática na mesma frase? rs

Beijos

l.c grazinoli disse...

Nao sei se sempre foi assim, mas hj em dia é.
E ai , o que fazemos pra mudar isso??

Gardênia Vargas disse...

Me pergunto a todo momento... o que podemos fazer? qual é meu limite e qual é o meu valor...?