30 de jun. de 2008

Pirataria x novas formas de direito autoral

Já discutimos aqui no Caroço sobre a pirataria de CDs e DVDs. Como disse na ocasião, acho que as empresas de produção e distribuição de audio e video deveriam começar a pensar em novas formas de comercialização (como já fazem algumas gravadoras e como fazem artistas independentes) ao invés de continuar a fazer, contra a pirataria, campanhas terríveis (cada vez mais terríveis, diga-se de passagem. No caso dos DVDs, da questão ética do pai que pode, com a compra de materiais piratas, incentivar o filho a colar na prova, agora assistimos, antes dos longas-metragens, à relação da compra dos materiais pirateados com o tráfico de drogas, seqüestros e assaltos).

Alguns países já começaram a pensar na questão, e mesmo a implementar novas regulamentações para o setor, como mostra matéria feita pelo Globo on line e reproduzida por Simone Pereira de Sá no blog Labcult, para o qual contribuo menos do que deveria.


Vou colar a íntegra da matéria aqui e, "pirateando" o post da Simone, incentivar a discussão sobre a lei espanhola e sobre o tipo de lei que poderia ser implementada no Brasil.



Lei de direito autoral na Espanha abre espaço para 'salvar' ganhos de artistas na era digital

Publicada em 23/06/2008 às 08h49m Rodrigo Pinto - O Globo Online

RIO - A entrada em vigor na Espanha, na semana passada - após caloroso debate de 15 meses no parlamento - do chamado canon digital, pode iluminar o pobre debate em torno dos downloads e cópias ilegais no Brasil. Na prática, o governo espanhol determinou a taxação na compra de aparelhos tocadores de MP3 e MP4, celulares, pen drives e discos rígidos externos. O imposto recolhido será usado para pagar direitos autorais, cujo volume vem se reduzindo em todo mundo em função do abandono de mídias físicas - como o CD - como suporte para músicas, filmes e outros bens culturais.
Ao invés de coibir a chamada cópia privada como forma de garantir que consumidores continuem pagando direitos autorais na compra de CDs, por exemplo, o governo espanhol ampliou o recolhimento sobre itens de armazenamento e reprodução de arquivos digitais. O país europeu, assim, se colocou no córner oposto ao dos Estados Unidos, que defendem - e praticam - ações policiais e prisão de internautas que baixem arquivos sem pagar.
- Na Espanha, o imposto foi adotado para que se permita a cópia privada. Esse é um dos modelos que o debate brasileiro tem ignorado - sublinha Ronaldo Lemos, diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas, onde coordena a área de propriedade intelectual, e também diretor do projeto Creative Commons no Brasil.
Ronaldo lembra que, desde 1998, quando foi aprovada a nova lei de diretos autorais no Brasil, está proibida a cópia privada.
- Inclusive para fins educacionais e científicos. Este debate traria de volta a possibilidade da cópia privada e para estes fins, o que era permitido na lei anterior, de 73. Não podemos continuar só na base do pode, não pode - critica.
No recente - e vertiginoso - processo de migração dos consumidores para a internet, os autores são a ponta mais frágil. Houve, nos últimos anos, quem imaginasse que, diante da enxurrada de downloads ilegais e CDs piratas, seria difícil remunerá-los. Mas o canon digital espanhol traz novas possibilidades, inclusive a de provedores de acesso serem incluídos no rateio dos recursos que pagarão autores em tempos de arquivos digitais trocados em alta velocidade e de forma incontrolável.
- Tem gente que ganha muito dinheiro na internet e acaba se privilegiando da reprodução e dos downloads de conteúdo que outra pessoa criou. Nesse sentido, parece-me sensato que sites, provedores, patrocinadores, enfim, paguem direitos autorais - defende o compositor Roberto Frejat, parceiro de Cazuza, líder do Barão Vermelho (em recesso) e atualmente dedicado a seu trabalho individual.
Atualmente, já há tecnologia para rastreamento de downloads de arquivos digitais que permitiria a contabilização e o rateio - tal como é feito na execução em rádio - e a repartição por amostragem. Se, no dial, quem toca mais ganha mais, na troca de arquivo digital, que for mais baixado ou executado (no YouTube ou no MySpace, por exemplo) teria uma porção maior no rateio.
- Isso é uso inteligente da tecnologia, que poderia ser aplicada no lugar da ação policialesca - acrescenta Frejat.
O assunto é polêmico e requer, de fato, mais e mais debate. Na Espanha, durante os 15 meses de dicussão, associações de internautas e produtores de eletrodomésticos criticaram duramente o imposto - antes restrito a CDs, DVDs, impressoras e gravadoras de CD/DVD.
"É um imposto injusto, porque incide com o mesmo valor sobre o celular que custa 50 euros e o que custa 500 euros", criticou, em depoimento ao site do jornal "El País", Víctor Domingo, presidente da Associação de Internautas da Espanha. No entanto, associações de autores, de editores de livros e de produtores cinematográficos comemoraram a mudança na lei.

3 comentários:

Carlos Augusto Monteiro disse...

É incrível estarmos vivendo em uma época em que se discute esse tipo de coisa. Acho um privilégio podemos acompanhar o surgimento de idéias que busquem uma solução para a questão dos downloads e compartilhamento digitais. A repressão realmente não é o caminho, já que é igual tentar segurar água com a mão. Uma iniciativa revolucionária como a troca de músicas via rede pede uma solução tão criativa quanto. Ótimo vcs terem aberto espaço pra essa discussão.

Monique Cardoso disse...

Nossa. Soa a mim meio absurdo taxar o aparelho que reproduz a obra sob a desculpa de dar esse dinheiro a arrecadação de direitos autorais. Muita gente compra discos e copia as faixas para seu tocador de mp3 simplesmente para ter portabilidade. Estará pagando o mesmo imposto duas vezes. Há muitos dowloads free. Bandas famosas, cuja música é reproduzida zilhões de vezes estão despejando seus discos de graça na rede. Estas bandas ganham dinheiro com shows, publicidade, fazendo música para videogame, sei lá, e liberaram os direitos ao ouvinte.
Não há nada mais maravilhoso que a quantidade de informação - e aí inclui-se a música feita pelo Frejat - a que podemos ter acesso hoje com a internet. Ainda é uma coisa para se admirar.
É preciso arrumar outras formas de remunerar direitos autorais e os autores também precisam rever os próprios papéis nesta questão. O mundo mudou. Infelizmente os artistas e criadores de uma maneira geral também precisam encontrar novas formas, e não só cobrar do governo que fiscalize e cobre os direitos.

A digestora metanóica disse...

Tenho dúvidas em relação à solução espanhola, mas me alegro com o surgimento de propostas alternativas ao "terrorismo" e a repressão.

Como a Monique comentou, muitas bandas já disponibilizam suas músicas - destaque máximo para o Radiohead, que lançou o álbum na Internet e pedia que as pessoas baixassem as músicas, no site oficial, pelo preço que quisessem pagar, valendo até centavos.