14 de abr. de 2008

Semente de Conto - RELÓGIO

Será que ela vai gostar das rosas que comprei? É bem capaz de reclamar, dizer que ando gastando além do que devo, ainda mais agora, desempregado. Mas ela me conhece bem, sabe que faço sempre o que me dá vontade, sabe-se lá se vou estar vivo amanhã. Vou deixar bem em cima da cama, só pra ela saber, logo de cara, que hoje eu quero. Vai pegar as flores e colocar aquela calcinha vermelha, que eu tanto gosto. Ou talvez coloque a branca, que eu finjo que gosto só pra agradar. Que mania que ela tem de sumir com o meu relógio. Já avisei que não é pra guardar nada, eu me entendo no meio da minha bagunça, mania estúpida de organização. Nem lembro quando foi a última vez que alguém veio aqui em casa, sei lá que idéia é essa de arrumar tanto. Mulher maluca. A não ser que venham aqui quando não estou. Cadê o relógio? Cadê? Ela já devia ter chegado, não sei o que faz no escritório até tão tarde. Deve ser aquele filho da puta do Sérgio, que sempre entope a coitada de trabalho. Fica lá, babando, vendo ela trabalhar. Se eu tivesse grana, juro que ela nunca mais pisava lá. Nunca mais. Melhor deixar as flores do lado da calcinha vermelha, pra ela não ter dúvida de qual usar. Mesmo que chegue tarde, mesmo que esteja exausta. Não quero saber. Quero ela cheirosinha pra mim. Porra, cadê a calcinha? Ela sempre arruma por cor, é maluca mesmo. Porra, cadê? Tinha que estar aqui, bem aqui, entre as pretas e as azuis. Quando chegar vai ter que se explicar, não nasci pra ser corno. Corno! Corno! Os dois devem estar agora naquela sala geladinha, transando e rindo da minha cara. O filho da puta do Sérgio babando na minha calcinha vermelha. Vagabunda! Chegou tarde, devia ter ligado. Cadê meu relógio? É, porra, eu coloquei as flores em cima da cama. Estavam aqui. Quem foi que te mandou? Quem? Claro que sabe do que estou falando, vagabunda! Não sou corno. Cala a boca! Cala a boca e não grita, se não vou ter que te calar. Chama o Sérgio agora, chama, puta! Amor? Ô, amor... perdoa, vai? Você fica tão linda assim, dormindo feito uma princesa, me dá até culpa de ter brigado contigo. Tá cedo ainda, não são nem oito horas. Acorda e veste aquela calcinha vermelha, que eu tanto gosto. Já deve estar seca, tá lá pendurada no varal desde ontem.

4 comentários:

Olívia Bandeira de Melo disse...

Comentar contos e afins é difícil, como já disse sobre o post do Lucas, tem hora que o silêncio é melhor. Mas não custa nada incentivar: adorei, Luluzinha!

A digestora metanóica disse...

Lu, me alimenta mais, vai?

Amo-te!

Deia Vazquez disse...

Adoro seus contos.
Conta mais, conta mais!

Luciana Gondim disse...

Amigas deliciosas! Amo vocês